Origem e decadência das Festas dos Pescadores de Cascais

Remontando a 1 de Setembro de 1964, as Festas dos Pescadores de Cascais, posteriormente designadas Festas do Mar, surgiram associadas às comemorações do VI centenário da vila. Impulsionadas pelo então comandante do porto de Cascais, realizaram-se na Praia da Ribeira, tendo atraído inúmeros espectadores interessados nas diferentes provas que foram disputadas.

Eis os objectivos dessas festas, as actividades que tiveram lugar nessa altura e que ficaram registadas no jornal A Nossa Terra:

A subida do pau ensebado. Fotografia: C. Camarate.

“O comandante do porto, sr. cap. tenente António Cardoso, não se poupou a esforços, mas conseguiu atingir o seu objectivo divertindo durante umas horas a gente simples do mar, que neste espaço de tempo esqueceu a rudeza da sua profissão e as lutas contra o invencível gigante, a cujas entranhas têm que arrancar o pão de cada dia.

Quer nas corridas de natação, pescadores – 400m, nadadores-salvadores  – 400m, rapazes – 200m e raparigas – 100m; nas regatas de chatas, de 2 a 3 remadores, na distância de 800m, ou nas corridas de sacos, quer na lide dos patos, exercício de varas ou na subida do pau ensebado, houve uma ilimitada alegria e apenas a satisfação de cada um mostrar quanto vale um dia de sã camaradagem.

Houve uma nota dominante de que lamentamos não poder publicar uma imagem, foi sem dúvida o banho das varinas. Cremos que a sua boa disposição contagiou a enorme assistência que por largo tempo as aplaudiu.

A «corrida» dos bravos patos foi também um espectáculo em que os «pirolitos» se misturaram com os desejos de agarrar o pato,  que contribuiu imenso para dar à festa o brilho que ela teve.

Parabéns, portanto, ao comandante sr. António Cardoso, a todos os organizadores e intervenientes da festa, que, achamos, se devia repetir mais anos para alegria de todos”[1].

O jornal A Nossa Terra voltou a dar conta das Festas dos Pescadores ocorridas em 1965, desta vez tendo sido realizadas em dois momentos distintos: o diurno, de carácter puramente desportivo e de destreza, e o nocturno, com danças, cantares e alegria, complementado com fogo-de-artifício modesto, saído das chatas que vagueavam lentamente à borda d’água[2].

No ano seguinte, realizadas com a colaboração da Casa dos Pescadores de Cascais, da Junta de Turismo da Costa do Sol, da Câmara Municipal e da Capitania de Cascais, estas festas viriam a incorporar um arraial e bailes, os quais tiveram lugar na esplanada em frente ao Hotel Baía[3].

Largada de patos (1964).
Fotografia: C. Camarate

Posteriormente, as Festas dos Pescadores foram enriquecidas com outras actividades, tais como garraiadas, a procissão de Nossa Senhora dos Navegantes e concertos. Contudo, a partir de meados da década de 2000, estas festas tradicionais começaram a perder a sua identidade, de tal modo que muitas pessoas locais já nem as consideram festas do mar, mas sim festas de Verão com concertos patrocinados pela CMC. De todas as actividades que atrás indicámos, só mesmo a dita procissão é que se manteve até aos nossos dias – tudo o resto que tinha a ver com o mar e os pescadores desapareceu!

Em pleno 2022, numa altura de acelerada descaracterização do centro histórico de Cascais e em que os pescadores casca(l)enses vão mostrando o seu desagrado pela forma como são tratados pela autarquia local, as chamadas Festas do Mar têm levantado grande polémica, de tal modo que não podemos ignorar o que se tem passado e aquilo que, em jeito de síntese, recentemente foi afirmado num post da página de Facebook “Pescadores OrigensdeCascais”:

“As festas da CMC

Houve tempo em que as “Festas do Mar” eram as festas dos pescadores e do mar. Hoje, nada têm a ver com esse denominador comum. Tristemente, o que se constata é que cada vez mais os pescadores e o mar são apenas o pretexto para a CMC organizar mais um evento/festival de Verão em que apoia tudo menos quem faz de Cascais a vila piscatória que tradicionalmente é.

Garraiada na praia da Ribeira (2000)

Os pescadores não estão, evidentemente, contra as Festas – aliás até são bem-vindas, sobretudo o momento tão querido aos pescadores que é o dia da procissão de Nossa Senhora dos Navegantes. Mas uma coisa é ser a favor das Festas, outra ser a favor DESTAS Festas: umas Festas em que a CMC não hesita em atropelar os pescadores e a sua vida diária.

Mudam a lota de local, o cais dos aprestos, onde todos os dias precisamos de acesso, porque é ali que trabalhamos a qualquer hora do dia sem condicionamentos, está agora limitado pelo posicionamento, à entrada do cais, de wc’s e roulotes de fastfood. Como se não houvesse mais sítio nenhum para os colocar. Senão bastasse, muitos de nós estamos agora privados de estacionamento a que tínhamos direito e estamos constantemente a ser multados no cais.

É, por isso, muito triste constatar que em vez de apoiar uma indústria onde trabalham mais de 100 pessoas para alimentar as suas famílias, para além de outras embarcações de pesca que fazem aqui porto, a CMC prefira continuar a prejudicar constantemente os pescadores, até nas suas Festas!

Deveriam copiar o bom exemplo da vila piscatória vizinha, Ericeira, onde os pescadores também fazem parte da sua identidade. Aí sim, são Festas do Mar. Uma vila onde o sector piscatório e sua tradição é acarinhado e protegido pelas suas gentes e dirigentes municipais. Isso é que é ser inclusivo”[4].

Algumas das tarjas colocadas há dias atrás, posteriormente removidas. Fotografia: Cascais. 24 horas.

O cenário é de tal modo preocupante que os pescadores, em sinal de protesto, exibiram, há poucos dias atrás, várias tarjas com frases no cais de aprestos[5]. Entretanto, um indivíduo desconhecido, que não faz parte da comunidade piscatória e que alegou estar a agir a mando de alguém com importantes funções na autarquia local, entrou no cais com uma faca para tentar remover essas tarjas, mas acabou por ser afastado do local[6].

No meio desta conjuntura surreal, alguns pescadores colocaram bandeiras negras nas embarcações e recusaram participar na procissão de Nossa Senhora dos Navegantes, realizada no passado dia 28 de Agosto. Aliás, no dia anterior, através da referida página de Facebook, havia sido dada uma explicação para tal:

“Queremos pedir desculpa aos cascalenses e a todas as gentes, por alguns de nós, em forma de protesto, com muito pesar, tristeza, porque somos todos crentes e a procissão será sempre o nosso momento nas festas. Este ano não estaremos presentes.

As bandeiras assinalam a nossa homenagem aos camaradas, familiares, desaparecidos e falecidos no mar assim como também representam o descontentamento e dificuldades que o sector piscatório atravessa no município.

Queremos também dizer e desejar a todas embarcações, camaradas e à população em geral que optam por realizar, acompanhar a procissão em terra e no mar, uma boa proa e que Deus nos acompanhe a todos”[7].

Por mais incrível que pareça, no meio disto tudo as redes sociais da autarquia local, assim como de alguns dos seus funcionários com cargos importantes, tentam passar a imagem de que tudo está bem. Aliás, face às críticas de que têm sido alvo, até reforçaram as publicações no Facebook envolvendo o mar e a pesca.

Talvez um dia as Festas do Mar voltem a recuperar a sua essência original, com várias actividades ligadas ao mar (mas sem animais), assim como os pescadores venham a ter o devido respeito e as condições necessárias para desenvolverem normalmente as suas actividades de trabalho. Se a História serve para algo, que sirva não apenas para valorizarmos os pescadores como meros actores do passado, mas também para compreendermos a sua importância no presente e no futuro de uma vila cujas raízes estão na pesca e em que as tradições devem ser reavivadas, mantidas e transmitidas aos vindouros.

Contudo, por agora, o cenário é outro: os interesses comandam, prioridades absurdas levam à descaracterização do centro histórico da vila, enquanto que a retórica, a máquina de propaganda e de favorecimento de imagem iludem a multidão. 

Marco Oliveira Borges | 2022


[1] “Festa dos Pescadores, em Cascais, integrada nas comemorações do VI centenário da vila”, A Nossa Terra, n.º 365, 1964, pp. 1 e 6.

[2] “Festas dos Pescadores”, A Nossa Terra, n.º 419, 1965, pp. 1 e 6.

[3] Manuel Eugénio Fernandes Silva e José Ricardo C. Fialho, Cascais e o mar, Cascais, União das Freguesias de Cascais e Estoril, 2019, p. 197.

[4] https://www.facebook.com/photo?fbid=737442120691381&set=a.104411107327822 (22/08/2022).

[5] “Pescadores de Cascais mostram indignação com faixas na baía”, Cascais. 24 horas, 25/08/2022 (disponível em https://www.cascais24.pt/p/pescadores-de-cascais-mostram.html?spref=fb&fbclid=IwAR3BLGcFVure91y8dxjfHikaXVkjWEM5Zziyms_wJu4tl9HgoNMMtPivtp8).

[6] “Armado com faca invade espaço de pescadores para cortar tarjas de indignação | Com vídeo”, Cascais. 24 horas, 25/08/2022 (disponível em https://www.cascais24.pt/p/armado-com-faca-invade-espaco-de.html?spref=fb&fbclid=IwAR0CsQiGWqWI4ijITgHwKSKZGoJsCk9I72e19rxuanVsfpYyHqhcV3j5Rns).

[7] https://www.facebook.com/photo?fbid=740263767075883&set=a.156819445420321 (27/08/2022).

Factos e contextualização: resposta alargada a José Cardim Ribeiro

Em resposta a um primeiro texto com afirmações falsas, ofensivas e caluniosas do Dr. José Cardim Ribeiro, repliquei de forma breve, deixando claro, desde logo, quem é que recorria a um “modus operandi pouco honesto”. Ao mesmo tempo, sugeri que o visado concretizasse as afirmações que fazia e exigi que se retratasse publicamente do texto que escreveu. Entretanto, enviaram-me um segundo texto de Cardim Ribeiro (em anexo), publicado igualmente no Archport. Mais uma vez, o autor apresenta afirmações de idêntico teor, assim como outras que, na generalidade dos dois textos e não sendo devidamente contextualizadas e documentadas, só contribuem para o engano. Infelizmente, não tendo correspondido ao que solicitei, aliás, tendo piorado a situação, sou obrigado a publicar este texto mais alongado, onde remeto para contextos concretos e factos, retomando igualmente alguns aspectos que já havia indicado, aduzindo também alguns dos trechos mais ofensivos e enganadores do pensamento de Cardim Ribeiro. Importa ainda acrescentar que se tentou avançar para um epílogo apressado do assunto no Archport, isto sem que eu sequer tivesse tido conhecimento da situação e do segundo texto de Cardim Ribeiro. Assim se vê como descaradamente se continua a manipular informação.

No decurso de investigações que eu estava a realizar sobre a actividade marítima e militar na costa de Sintra e Cascais, fui alertado por Tiago Machado Castro, em 2009/2010, para o facto de que uma estrutura de origem muçulmana tinha sido descoberta no Alto da Vigia, sítio onde decorriam recentes trabalhos arqueológicos. Certo tempo depois, quando estava a reunir informações para um primeiro artigo sobre a defesa costeira durante o período islâmico, abarcando o referido espaço geográfico, entrei em contacto telefónico com o Museu Arqueológico de São Miguel de Odrinhas (MASMO). Daí em diante, sempre que precisei de tirar algum tipo de dúvida ou aferir assuntos/factos relevantes que podiam ajudar a compreender melhor o Alto da Vigia e a área onde se situa, passei a falar com o arqueólogo Alexandre Gonçalves, inicialmente por telefone e depois por e-mail. O objectivo, como é evidente, não era, e nunca foi, o de fazer um estudo específico sobre aquele arqueossítio, mas sim integrá-lo igualmente num contexto histórico mais alargado da costa de Sintra, área de inquestionável potencial.

Desde logo fui aconselhado por Alexandre Gonçalves a consultar os relatórios arqueológicos, pelo que me desloquei algumas vezes à DGPC (inicialmente ainda era IGESPAR) para o fazer e de acordo com a legislação então em vigor [1]. No meu texto anterior de resposta já tinha referido que as primeiras referências que publiquei sobre o Alto da Vigia, num artigo datado de 2012, mas que só saiu em 2013, foram alusões genéricas e de integração num contexto histórico mais amplo que então estava a analisar[2]. Neste sentido, usei um relatório de escavação correspondente à campanha de 2008, o qual fora entregue à tutela já em 2009[3]. Como não me disponibilizaram todos os relatórios numa das deslocações que fiz à referida instituição, se bem me recordo na primeira, tendo-me sido dito somente que o de 2009 é que estava livre para consulta, vi-me na obrigação, nesse mesmo artigo com data de 2012, de citar igualmente a página do MASMO onde se encontrava informação dedicada ao arqueossítio do Alto da Vigia [4]. Ora, como também já tinha indicado, estas fontes estão devidamente identificadas no meu artigo[5].

Importa ainda relembrar que esse meu trabalho foi dado à estampa já em 2013, portanto, depois da publicação de um texto de Raul Losada no número 0 de PortugalRomano.com. Revista de Arqueologia Romana em Portugal (online). É um número que, ao que parece, foi publicado a 28 de Fevereiro de 2012[6], sendo que só tomei conhecimento num momento posterior[7]. Aquele texto é a primeira publicação sobre as descobertas arqueológicas do Alto da Vigia, apresentando igualmente o ribat. Também não se pode esquecer que foi apadrinhada pelo próprio Dr. Cardim Ribeiro, enquanto “colaborador externo”. Face ao exposto, naquele meu texto antecedente ficou claro que, afinal, “o modus operandi pouco honesto” era o de Cardim Ribeiro, pois não fazia qualquer sentido o que tinha dito contra mim. Neste caso específico, que tinha sido “a primeira pessoa a comunicar ao meio científico, através de publicação, a importantíssima descoberta do ribat do Alto da Vigia, adiantando-se por sua conta e risco a todos os membros da própria equipa operante no terreno”.

Tendo sido “reavivada” a memória ao visado, em resposta, o próprio tentou atenuar a sua apressada e inglória acusação com a seguinte passagem: “faz parte dos mais elementares princípios de educação e boa convivência académica contactar os autores dos relatórios arquivados na DGPC ante de os consultar para fins de publicação de dados, e mais ainda se existe um relacionamento pessoal prévio entre ambas as partes, mesmo que sumário […]”. Ora, mais uma vez, Cardim Ribeiro está mal informado/esquecido quando toca neste assunto, pois já referi que fui aconselhado a consultar os relatórios por um dos membros do MASMO. Mas mais. Em 2016, quando estive como voluntário na escavação do Alto da Vigia e fiquei surpreendido por se ter mudado a interpretação arqueológica de “torre de facho” para “vigia”, também fui aconselhado a consultar o relatório de 2015 para melhor compreender o assunto. Por seu turno, Cardim Ribeiro referiu para lhe enviar um e-mail, sendo que responderia com informação sobre a nova interpretação e outro dos assuntos falados oralmente.

Voltando um pouco atrás, como foi recebido, em 2013, o meu artigo por parte da equipa do MASMO? A 18 de Abril de 2013, depois daquele meu primeiro artigo ter saído, enviei-o por e-mail a Alexandre Gonçalves, que, dias depois, agradeceu e indicou que, embora não o tivesse lido com toda a atenção que merecia, parecia “deveras interessante” e referiu ter reencaminhado para Cardim Ribeiro[8]. Nunca recebi qualquer feedback negativo no sentido de que tivesse cometido algum tipo de prática deontológica errada, até porque consultar os relatórios para poder enquadrar o assunto foi das primeiras coisas a que fui aconselhado pelo próprio Alexandre Gonçalves.

Nem mesmo algum tipo de problema aconteceu quando conheci Cardim Ribeiro, em 2016, altura em que tive oportunidade de lhe agradecer algumas pistas de investigação que me deu nesse momento, de pedir informações sobre as estruturas romanas descobertas no vale do rio Lizandro e de lhe enviar quatro artigos meus, tendo o próprio respondido dizendo que já havia imprimido os exemplares e agradecido o “tão suculento envio”[9]. Cardim Ribeiro enviou-me igualmente um artigo seu, ainda em versão de provas, onde até fazia uma citação do meu artigo com data de 2012, algo que me havia dito previamente. Quais as chamadas de atenção e críticas que me foram dirigidas? Nenhumas!

Fazendo a tal citação, no contexto da mudança interpretativa atrás referida, o autor limitou-se a indicar, em nota de rodapé, que os alicerces que, por vezes, eram referidos ter “pertencido a uma «torre de vigia», a um «facho», ou mesmo a uma «torre do facho»”[10] eram somente um mero abrigo permanente, referido também como sendo uma vigia. Ou seja, havia mudado a interpretação arqueológica que eu e outros autores tínhamos lido nas informações dos relatórios e/ou na página do MASMO[11], mas Cardim Ribeiro não indicou nenhum relatório arqueológico, o que seria o mais adequado para referir essa mudança, pois pressupõe, da parte de quem está a ler, que a interpretação era minha. Aliás, antes do meu artigo sair, e conforme já foi salientado, a informação das descobertas arqueológicas tinha sido publicada com grande destaque no texto de Raul Losada, onde é igualmente referida a torre de facho[12]. Neste contexto, assinalar as mudanças de pensamento e indicar qual a sua origem verdadeira é um passo indispensável, assim como bem exemplifica o presente contexto de polémica, onde todos devem ser elucidados da melhor forma. Qual a razão para Cardim Ribeiro ter feito o oposto?

Em Setembro de 2016, durante alguns dias, fui voluntário nos trabalhos arqueológicos do Alto da Vigia, e não “um simples visitante da escavação”. Cardim Ribeiro esqueceu-se de que a página de Facebook do MASMO e outras plataformas digitais[13], pelo menos desde 2013, publicaram alguns posts a solicitar voluntários para tal? Seja como for, durante aquele tempo tive possibilidade de conhecer melhor o sítio. No decorrer dos dias que lá estive foram sendo trocadas diversas ideias com Alexandre Gonçalves e outro dos voluntários, sendo que tive oportunidade de tentar explicar mais detalhadamente, sobretudo no âmbito da defesa costeira e com base no contexto histórico-geográfico de Sintra, a forma como interpretava aquela área junto à praia das Maçãs, divergindo um pouco da informação contida nos relatórios.

Em Novembro do mesmo ano, no âmbito do Colóquio dos 500 anos do Foral de Colares, fui, juntamente com Cardim Ribeiro, um dos oradores desse evento, tendo partilhado, inclusive, o mesmo painel. A minha comunicação foi sobre “A navegabilidade do rio de Colares e a defesa costeira durante o Período Islâmico”. Nessa altura apresentei o estado da arte sobre o assunto e algumas hipóteses explicativas novas. Nada de negativo foi proferido, isto quando o próprio Alto da Vigia integrou igualmente os meus slides explicativos, se bem que tenha sido chamado a atenção para alguns aspectos que, no entender de Cardim Ribeiro, eu deveria corrigir. Era o caso de, por exemplo, não se estar perante um rio, mas sim diante de um esteiro de mar que avançava por Colares adentro. Agradeci os comentários e, dentro do possível, assimilei aquilo que me pareceu correcto. Nem sempre se pode concordar com tudo.

No ano seguinte foram publicados novos artigos que também integravam o Alto da Vigia numa área mais alargada de Sintra, sendo que continuei a citar os relatórios arqueológicos e artigos de Cardim Ribeiro[14]. As últimas informações que usei sobre o Alto da Vigia, precisamente nesses estudos, são relativas aos trabalhos de 2015, tendo citado o relatório entregue à DGPC em 2016[15]. Portanto, tratam-se de informações anteriores à minha passagem pelo local como um dos voluntários dos trabalhos. Neste sentido, o Dr. Cardim Ribeiro incorre novamente num ruinoso lapso temporal quando, contraditoriamente, no seu primeiro texto diz:

[…] Oliveira Borges abusou, sem qualquer escrúpulo deontológico, da dita «disponibilidade sempre demonstrada», publicando em primeira mão e como coisa sua muitas das evidências arqueológicas que presenciou no decurso dos trabalhos arqueológicos a que era alheio, bem como opiniões, ou mesmo hipóteses científicas, que ouviu da boca dos membros da equipa”.

Face a tudo o que tem vindo a ser demonstrado, acho muito estranha a atitude de Cardim Ribeiro, isto cerca de dez anos após os primeiros contactos que tive com pessoas do MASMO e durante um período em que ninguém me alertou para algum tipo de procedimento erróneo. Se eu me tivesse apropriado de dados e ideias, como é que ninguém tinha visto? Como é que nada havia sido referido? Mais incrível ainda, se havia uma opinião negativa sobre mim, então porque razão deixaram que eu participasse como voluntário nas escavações de 2016? Qual é a coerência nisto tudo? A partir de agora, parece que qualquer investigador que consultar os relatórios arqueológicos do Alto da Vigia, que se aproxime demasiado deste local, que peça algum tipo de esclarecimento ou que revele ideias divergentes, pode estar sujeito a que Cardim Ribeiro o acuse de ser alguém sem “escrúpulo deontológico”.

Outro ponto que Cardim Ribeiro acusa mas não concretiza diz respeito às alegadas “opiniões, ou mesmo hipóteses científicasouvidas da “boca dos membros da equipa” e que não citei. Que opiniões e hipóteses são essas? Neste contexto, aliás, convém referir, mais uma vez, que as opiniões ou hipóteses científicas trocadas não vieram apenas da parte de elementos do MASMO, pois fui tendo oportunidade de as referir igualmente, algumas vezes com base no conhecimento de fontes históricas e de pistas presentes em diferente bibliografia que não estava a ser tida em conta. É evidente que percebi, em várias ocasiões, que as minhas hipóteses não eram acolhidas, igualmente por Cardim Ribeiro.

No artigo com data de 2012, agradeci a Alexandre Gonçalves o facto de me ter referido que havia um estudo que indicava a descoberta de ânforas romanas no Mucifal[16], elemento importante para adicionar à problematização do povoamento romano na área do vale de Colares, outrora invadido pelo mar. Nesse mesmo artigo, embora num outro contexto, indiquei uma informação que havia sido partilhada por Maria Teresa Caetano[17]. Quem tiver oportunidade de ver com a devida atenção os meus artigos, vai notar outras indicações e agradecimentos deste tipo.

Olhando outro caso, num artigo de 2017 fiz questão de salientar e agradecer a indicação de uma hipótese colocada por Alexandre Gonçalves, isto durante uma das conversas que tivemos. Não poderia ser de outra forma. O assunto dizia respeito às ruínas de edifícios recentes situados mais próximos da praia das Maçãs, um deles um miradouro e outro um restaurante que estava activo na segunda metade do século XX, sendo que os mesmos podiam ter sido construídos sob plataformas sustentadas – pelo menos em parte – por muros que podiam estar relacionados com a construção de uma antiga estrutura militar. Alexandre Gonçalves indicou que se distinguiam relativamente bem das estruturas mais recentes que se encontram por cima, pelo que poderiam corresponder ao início da obra militar, que, entretanto, poderá ter sido parada[18]. O Dr. Cardim Ribeiro notou isto? Parece que não!

Atente-se numa outra passagem do primeiro texto de Cardim Ribeiro:

“Não se trata, como é óbvio, de uma questão de diferenças de opinião, até porque – ao que saibamos – Oliveira Borges não é arqueólogo, nem epigrafista, nem especialista em História Antiga. Mas sim de um claro abuso da boa fé de quem o recebeu durante os trabalhos e com ele trocou impressões. Apenas um exemplo: será normal que um simples visitante da escavação – único estatuto que, neste contexto, se poderá com justeza atribuir a Oliveira Borges – seja a primeira pessoa a comunicar ao meio científico, através de publicação, a importantíssima descoberta do ribat do Alto da Vigia, adiantando-se por sua conta e risco a todos os membros da própria equipa operante no terreno? Será que Oliveira Borges nunca ouviu falar em prioridade científica? Nem em regras deontológicas?”

Cardim Ribeiro frisa bem que eu não sou “arqueólogo, nem epigrafista, nem especialista em História Antiga”. Mas antes não ser um especialista em determinada área do conhecimento do que ser um especialista desactualizado, preconceituoso, com pretensão de superioridade e que pensa poder abafar vozes divergentes. Em vez de egos, posses e conveniências, o conhecimento universal é que deve estar em primeiro lugar. Se entrarmos na parte da necessidade de haver um contexto histórico mais aprofundado, então porque razão um historiador que estuda igualmente – por sua vontade própria – aquela região não pode aduzir ideias? Quando comecei a consultar os relatórios do Alto da Vigia, o local não estava a ser enquadrado com as questões de navegação associadas ao esteiro de Colares e à existência de um porto no interior, nem com a história militar de Sintra. Daí que isso também não viesse indicado na referida página do sítio do MASMO, assim como no texto de Raul Losada.

Naquela altura já tinha consultado e estava a citar a monografia de Colares[19], fundamental para quem está a estudar a região, de onde colhi importantes informações que ajudaram a construir o meu artigo com data de 2012 e a desenvolver mais algumas ideias, mormente para o período islâmico. Para além disso, havia diversa informação em fontes históricas e outra bibliografia que ajudava a enquadrar melhor o local, pelo que fui recolhendo e problematizando diversos dados num contexto geral da história de Sintra, onde o contributo de todos os investigadores deve ser tido em consideração. Conforme referiu o historiador Marc Bloch (1886-1944), num trecho escrito há muito tempo, mas incrivelmente actual:

“A vida é muito breve, os conhecimentos a adquirir muito longos para permitir, até para o mais belo génio, uma experiência total da humanidade. O mundo actual terá sempre seus especialistas, como a idade da pedra ou a egiptologia. A ambos pede-se simplesmente para se lembrarem de que as investigações históricas não sofrem de autarquia. Isolado, nenhum deles jamais compreenderá nada senão pela metade, mesmo em seu próprio campo de estudos; e a única história verdadeira, que só pode ser feita através de ajuda mútua, é a história universal”[20].

Surpreendentemente, dez anos após o início de investigações sobre a costa de Sintra, e depois de várias comunicações feitas e alguns artigos publicados, onde sempre citei o que tinha para citar, sou agora confrontado com este tipo de textos e de acusações. O que é que, entretanto, mudou? A 12 de Junho publiquei um post sobre o Alto da Vigia, baseado num excerto de um artigo científico publicado em 2017[21]. Alguém enviou o post a José d’Encarnação, que, como resposta, escreveu um texto tristemente depreciativo que já tive ocasião de mostrar o quão errado está. Contudo, Cardim Ribeiro não perdeu a oportunidade de me atacar, sem qualquer motivo minimamente válido, só por me aproximar do Alto da Vigia e por apresentar nos meus estudos diferentes perspectivas sobre um sítio arqueológico que lhe é querido, mas que, lamento, não é sua propriedade privada.

Concluindo, o que é mais surreal e triste no meio disto tudo é ver como pessoas com vastíssima experiência no mundo da investigação, e com estatuto académico reconhecido, conseguem, de forma perturbadoramente tranquila, distorcer e manipular factos e desprezar trabalho sério de investigação, não promovendo o debate sério e vivo, algo que seria fundamental para o avanço do conhecimento.

Marco Oliveira Borges | 2020

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[1] “Os relatórios serão objecto de publicação nos termos referidos nos números seguintes e estarão disponíveis nos arquivos do IPA para consulta pública, salvaguardados os direitos de autor sobre os elementos inéditos constantes dos relatórios de progresso ou no relatório final, se este não for elaborado para publicação” (Decreto-Lei n.º 270/99, in Diário da República, I série – A, n.º 163 – 15-7-1999).

[2]  Marco Oliveira Borges, “A defesa costeira do litoral de Sintra-Cascais durante o Garb al-Ândalus. I – Em torno do porto de Colares”, História. Revista da FLUP, IV sér., vol. 2, Porto, pp. 118 (n. 52) e 119 (62) (https://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/11320.pdf).

[3] Patrícia Jordão, Pedro Mendes, Alexandre Gonçalves, Alto da Vigia (Colares, Sintra). Relatório dos Trabalhos Arqueológicos [de 2008], 2009. Depositado no Arquivo de Arqueologia do IGESPAR sob o código 2008/1 (584).

[4] Na altura era http://www.museuarqueologicodeodrinhas.pt/escavacoes/1/alto-da-vigia.html (consultada em 25/10/2011). Actualmente é http://museuarqueologicodeodrinhas.cm-sintra.pt/escavacoes/1/alto-da-vigia.html (consultado em 05/07/2020).

[5] Marco Oliveira Borges, op. cit., pp. 118 (n. 52) e 119 (n. 62).

[6] Raul Losada, “Monumental santuário romano do sol e da lua. Sítio arqueológico do Alto da Vigia (praia das Maçãs, Colares)”, PortugalRomano.com. Revista de Arqueologia Romana em Portugal, [2012], pp. 26-35 (https://issuu.com/portugalromano/docs/revista).

[7] Só já na minha dissertação de mestrado, entregue à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa em Setembro de 2012 e defendida em Fevereiro do ano seguinte, é que citei o texto de Raul Losada, mas juntamente com o site do MASMO e o referido relatório: cf. Marco Oliveira Borges, O porto de Cascais durante a Expansão Quatrocentista. Apoio à navegação e defesa costeira. Dissertação de Mestrado em História Marítima, Universidade de Lisboa, 2012, p. 179 (n. 676).

[8] E-mail enviado por Marco Oliveira Borges a Alexandre Gonçalves (18/04/2013). E-mail enviado por Alexandre Gonçalves a Marco Oliveira Borges (23/04/2013).

[9] A conversa continuou por e-mail. E-mail enviado por Marco Oliveira Borges a José Cardim Ribeiro (8/09/2016). E-mail enviado por José Cardim Ribeiro a Marco Oliveira Borges (20/09/2016).

[10] José Cardim Ribeiro, “Ad Antiquitates Vestigandas. Destinos e itinerários antiquaristas nos campos olisiponenses ocidentais desde inícios a meados do século XVI”, in Gerard González Germain (coord.), Peregrinationes ad inscriptiones colligendas. Estudios sobre epigrafía de tradición manuscrita, Bellaterra, Universitat Autònoma de Barcelona, 2016, p. 140 (n. 4).

[11] Cf., e.g., Fernando Branco Correia, “Fortificações de iniciativa omíada no Garb al‐Andalus nos séculos IX e X – hipóteses em torno da chegada dos Majus (entre Tejo e Mondego)”, in Isabel Cristina F. Fernandes (coord.), Fortificações e Território na Península Ibérica e no Magreb (Séculos VI a XVI), vol. I, Lisboa, Edições Colibri/Campo Arqueológico de Mértola, pp. 77 e 84 (n. 31).

[12] Raul Losada, op. cit., pp. 26-35.

[13] Para o caso de 2016, cf. https://tinyurl.com/ycd5e5d2.

[14] Cf. Marco Oliveira Borges, “A importância estratégica do conhecimento do território na formação de um sistema defensivo: o caso de Sintra (Portugal) durante o Período Islâmico”, Anuario de Historia Regional y de las Fronteras, vol. 22, n.º 2, Bucamaranga, 2017, pp. 17-48 (https://tinyurl.com/ya49odpb); idem, “Paisagem cultural marítima de Sintra: uma abordagem histórico-arqueológica”, in Pedro Fidalgo (coord.), Estudos de paisagem, vol. III, Lisboa, Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, 2017, pp. 230-272 (https://tinyurl.com/yatmhrxn).

[15] Cf. idem, “A importância estratégica […]”, pp. 28-31; idem, “Paisagem cultural marítima de Sintra […]”, pp. 251-263; idem, “Navegação comercial fluvio-marítima […]”, pp. 235 e 247.

[16] Idem, “A defesa costeira do litoral […]”, p. 118 (n. 60).

[17] Idem, ibidem, p. 127 (n. 98).

[18] Idem, “Paisagem cultural marítima de Sintra […]”, p. 264 (n. 368).

[19] Maria Teresa Caetano, Colares, Sintra, Câmara Municipal de Sintra, 2000 [2.ª ed. rev., 2016].

[20] Marc Bloch, Apologia da História ou o ofício de historiador. Trad. de André Telles, pref. de Jacques Le Goff, Rio de Janeiro, Zahar, 2001, p. 68.

[21] Marco Oliveira Borges, “O Alto da Vigia no tempo dos romanos: uma interpretação alternativa sobre este sítio arqueológico”, Sintra e Cascais. Mar, Terra, História, 2020 (https://tinyurl.com/yb3nmvjj).

Breve resposta a José Cardim Ribeiro

O Professor José d’Encarnação, no seguimento da polémica a que deu origem, sobre o Alto da Vigia (Colares, Sintra), fez-me chegar um texto deveras surpreendente, do Dr. José Cardim Ribeiro, igualmente publicado no ArchPort (em anexo). O conteúdo desse texto, intitulado “Depoimento sobre certas atitudes de Marco Oliveira Borges”, e no qual o autor assume-se como paladino da bondade, tendo mesmo afirmado “que de acordo com o meu carácter, preferiria guardar só para mim”, na realidade, não é mais do que um chorrilho de dislates sobre o meu carácter, enquanto homem e investigador, eivado de considerandos ofensivos, porém reveladores do verdadeiro “carácter” do seu autor. Não querendo entrar pelo mesmo caminho, assinalo algumas questões que me parecem fundamentais.

As primeiras referências que publiquei sobre o ribat, num artigo datado de 2012 mas que só saiu em 2013, não passaram de alusões genéricas e de integração num contexto mais amplo que então estudei. Socorri-me de um relatório de escavação, correspondente à campanha de 2008 (de acordo com a legislação então em vigor, designadamente, o Artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 270/99, de 15 de Julho), e da informação constante no site do Museu Arqueológico de São Miguel de Odrinhas dedicada ao arqueossítio do Alto da Vigia. Ambas as fontes estão devidamente identificadas no meu artigo[1].

Datado de 2012, este artigo foi dado à estampa já em 2013, depois da publicação de um texto subscrito por Raul Losada, no número 0 da Revista de Arqueologia Romana em Portugal (online), ao que parece publicado a 28 de Fevereiro de 2012[2], e do qual só tomei conhecimento posteriormente, razão pela qual não o inclui no meu texto. Esta publicação parece constituir a primeira referência publicada sobre o arqueossítio do Alto da Vigia e do ribat, tendo sido apadrinhada pelo próprio Dr. Cardim Ribeiro, enquanto “colaborador externo”, como consta, aliás, na respectiva ficha técnica.

Afinal, de quem foi “o modus operandi pouco honesto”? Meu, não foi certamente! O meu artigo foi dado à estampa no ano seguinte ao de Losada e os passos que dei para a sua elaboração estavam dentro da lei. Por conseguinte, é preciso um total descaramento e ausência de escrúpulos para afirmar – perante esta evidente discrepância cronológica – que fui eu “a primeira pessoa a comunicar ao meio científico, através de publicação, a importantíssima descoberta do ribat do Alto da Vigia, adiantando-se por sua conta e risco a todos os membros da própria equipa operante no terreno?” Se o tom do Dr. Cardim Ribeiro roça a ofensa bacoca, aqui estamos perante uma grave acusação que pretende afectar o meu bom nome e a minha carreira científica, sendo que não me apropriei de propriedade alheia, nem tão-pouco deixei de respeitar os normativos deontológicos.

Assim, quando afirma levianamente, que publiquei “em primeira mão e como coisa sua muitas das evidências arqueológicas que presenciou no decurso dos trabalhos arqueológicos a que era alheio, bem como opiniões, ou mesmo hipóteses científicas, que ouviu da boca dos membros da equipa”, então importa saber quais.

Afinal, é este, Cardim Ribeiro, o investigador sério que se tenta bater moralmente por princípios de honestidade e deontologia? Parece que não e, no seguimento do que foi referido, exijo uma retratação pública no mesmo lugar e com o mesmo destaque do texto que publicou, deixando claro que, caso não o venha a fazer no prazo de uma semana, vejo-me obrigado a apresentar um texto com informação mais detalhada e documentada para clarificar a presente situação.

Marco Oliveira Borges | 2020

Cardim

[1] Marco Oliveira Borges, “A defesa costeira do litoral de Sintra-Cascais durante o Garb al-Ândalus. I – Em torno do porto de Colares”, História. Revista da FLUP, IV série, vol. 2, Porto, respectivamente nas pp. 118 (n. 52) e 119 (n. 62) (https://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/11320.pdf).

[2] Raul Losada, “Monumental santuário romano do sol e da lua. Sítio arqueológico do Alto da Vigia (praia das Maçãs, Colares)”, Revista de Arqueologia Romana em Portugal, [2012], pp. 26-35 (https://issuu.com/portugalromano/docs/revista).

Do desconhecido “invisível” ao sábio “superior”: uma resposta a José d’Encarnação

Em Março de 2017, no âmbito do I Colóquio Ibérico de Paisagem – O estudo e a construção da Paisagem como problema metodológico, realizado em Lisboa, apresentei uma comunicação intitulada “Paisagem cultural marítima de Sintra: uma abordagem histórico-arqueológica”. Um dos locais aí abordado, a par do Espigão das Ruivas, do cabo da Roca e da enseada de Assentis, foi o Alto da Vigia. Como em qualquer outro evento científico do género, a seguir às comunicações houve um momento para a colocação de questões e o esclarecimento de dúvidas. É, sobretudo, nestas alturas que o investigador pode ser directamente posto à prova pelos congéneres da sua área. Isso é sempre bastante proveitoso, pois permite ouvir críticas ou perspectivas diferentes e, consoante os casos, corrigir aspectos e ir um pouco mais além no conhecimento. Naturalmente que respondi às questões e observações que me foram colocadas naquela altura, inclusive já em off, e só tenho de agradecer os comentários.

Poucos meses após o referido colóquio foram disponibilizadas (online) as actas, distribuídas em três volumes, coordenados por Pedro Fidalgo, sendo que no terceiro encontra-se o artigo que escrevi[1]. Já a 12 de Junho de 2020, usei uma parte desse artigo – aquela que aborda o Alto da Vigia durante o período romano – para um texto de divulgação que foi publicado no meu blogue sobre a história de Sintra e Cascais[2]. Tive o cuidado de mencionar, em nota de rodapé, de onde provinha o texto, ainda que o mesmo apresentasse ligeiras modificações, aspecto que também indiquei.

Entretanto, ontem fui informado de que o professor José d’Encarnação tinha colocado um texto no Archport a criticar o meu post sobre o Alto da Vigia (em anexo). Caso não tivesse sido avisado sobre o assunto, nada saberia sobre isto, pelo que também não poderia fazer a minha defesa. Pelo tom baixo, exagerado e tendencioso do autor, que finge não conhecer o meu trabalho e percurso desenvolvido, é dado a entender que cometi um atentado deontológico e que ando a brincar aos investigadores. Porém, antes de seguir para as questões do Alto da Vigia, importa aduzir alguns factos para que se avive a memória.

Em 2010, depois de assistir a uma conferência que se realizou no Museu do Mar Rei D. Carlos, abordei José d’Encarnação, apresentei-me e expliquei que estava a investigar assuntos da história de Cascais e a reunir dados para uma tese de mestrado que iria desenvolver sobre o porto local durante o século XV. Nessa altura, Encarnação entregou-me um cartão de visita (ainda o tenho), de modo a que o pudesse contactar por e-mail, algo que fiz, obtendo uma resposta. Nunca mais falei com o visado, sendo que seria perfeitamente compreensível que não se lembrasse do que acabei de referir, pois já passaram dez anos e a memória pode pregar partidas. Todavia, não deixa de ser misterioso que, não conhecendo o meu trabalho de investigação e de divulgação, apesar dos vários contributos que têm sido publicados sobre a História de Sintra e Cascais desde 2012, o autor tenha citado um artigo meu num estudo recente que escreveu em co-autoria sobre o Espigão das Ruivas[3]. Posso acrescentar que José d’Encarnação teve publicado um texto no último número do Arquivo de Cascais (2015), sendo que também tive a oportunidade de participar com um artigo em co-autoria. Refira-se igualmente que Encarnação, desde Maio de 2015, faz parte de um grupo que criei no Facebook, intitulado “Arqueologia e História de Cascais”, pelo que pressuponho que vê ou já viu algumas das publicações ali feitas. Não querendo desenvolver aqui este tipo de assunto, que daria pano para mangas no contexto da história de Cascais, acrescento apenas que é muito estranho que Encarnação não tenha notado em nenhum destes aspectos que referi. É muita “desatenção” junta! Qualquer investigador no activo deve estar atento e actualizado, não apenas quando é conveniente.

Relativamente ao Alto da Vigia, talvez José d’Encarnação não saiba que estou em contacto com os arqueólogos do Museu Arqueológico de São Miguel de Odrinhas desde 2010 ou 2011, e que, em 2016, participei, durante alguns dias, na escavação arqueológica que decorre naquele local desde 2008. No entanto, com todo o respeito, reconhecimento e mérito que aqueles arqueólogos merecem, a quem só tenho a agradecer pela disponibilidade sempre demonstrada, isso não significa que se concorde com toda a interpretação que tem sido feita sobre o local. Isto da mesma forma que sei que algumas interpretações que eu e outros investigadores colocámos não são acolhidas. E existe algum mal nisso? Claro que não. Em vários artigos que tenho vindo a desenvolver, sobretudo para o período de ocupação islâmica, tenho citado os relatórios arqueológicos do Alto da Vigia, seguido indicações e, por vezes, apresentado interpretações que divergem ou que complementam aspectos que têm sido dados a conhecer. E isso acontece igualmente no post criticado por Encarnação, que, como se viu, só parece ter olhos e memória para o que lhe convém.

Sendo assim, que interpretações alternativas/complementares aduzi que não têm sido tidas em conta? De uma forma geral, penso que um sítio com as características do Alto da Vigia precisa de ser enquadrado mais aprofundadamente no contexto da história marítima local, ao longo dos diferentes períodos históricos, sendo que a colocação de hipóteses com base em diferentes dados dispersos pode ajudar a avançar no conhecimento. É nesse sentido que também tenho seguido as indicações de Maria Teresa Caetano, cuja monografia que elaborou sobre Colares é de consulta fundamental quando se abordam temas histórico-arqueológicos locais[4]. Neste contexto, tenho seguido diversas indicações e pistas deixadas, seja reforçando a ideia de navegabilidade para o interior do território, seja indicando novas interpretações e os vários vestígios arqueológicos que foram encontrados nas proximidades do chamado rio de Colares e que ajudam a pensar na antiga existência de estruturas ou de povoados. Veja-se, por exemplo, o caso do Mucifal, que tenho tido oportunidade de divulgar, indicando inclusive uma hipótese colocada oralmente por José Cardim Ribeiro: a de que as ânforas ali encontradas poderão estar associadas à produção local de preparados piscícolas e à existência de cetárias romanas na área do esteiro de Colares.

Seja como for, quem estiver minimamente atento ao que se tem produzido a nível científico, e não apenas ao conteúdo do post de Junho, vai notar que existem algumas diferenças interpretativas, sendo sempre interessante analisar a evolução de diferentes perspectivas de pensamento ao longo dos anos. Eis uma passagem muito importante que referi no artigo de 2017 e, posteriormente, no referido post, não sendo correcto, no seguimento do que fez José d’Encarnação, fazer a apresentação das ideias aí contidas através de pequenas citações truncadas, omitindo o resto do conteúdo:

“De qualquer forma, é muito provável que a área do Alto da Vigia e imediações, com larga extensão, tenham tido igualmente outras funcionalidades para além daquelas associadas ao santuário. Em tempos recuados, poderá mesmo ter havido uma extensão habitável. Essa situação seria facilitada por condições meteorológicas e oceanográficas mais aprazíveis à fixação costeira do que na actualidade, sendo na altura caracterizadas, nomeadamente, pela menor intensidade de vento e de agitação marítima. Isso deveu-se à fraca presença de upwelling no Ocidente ibérico[5], traduzindo-se esse factor, efectivamente, na parca intensidade da nortada e menor altura das ondas em relação ao que no presente se verifica[6], se bem que não se possa falar numa total ausência de vento[7]. Por outro lado, é possível que possa ter havido algum tipo de exploração económica romana nessa área, fosse ligada à terra ou ao mar. O mesmo se pode pensar nalgum tipo de edifício de apoio à navegação, talvez até um posto de controlo romano do acesso naval ao interior de Sintra. Recorde-se que em pleno século I d.C., altura em que os romanos terão construído o dito santuário, o esteiro de Colares era navegável, constituindo-se assim como um canal privilegiado de comunicação e ligação naval com o interior do território”.

José d’Encarnação, que parece não ter notado que o post resulta de um excerto de um artigo científico, refere “que não passa de um amontoado de citações”, assentes na “apresentação de hipóteses já por outros colocadas”. Se assim é, e para além dos aspectos que atrás assinalei, que diga, relativamente ao Alto da Vigia e às frases que citou, em que locais estas hipóteses têm sido destacadas em conjugação com a ideia de que, com condições meteorológicas e oceanográficas mais aprazíveis à fixação costeira do que na actualidade (o que tem sido apontado para a Antiguidade), outras estruturas e funções poderiam ter existido naquela área. No meio de diversos estudos e relatórios lidos a partir de 2009/2010, altura em que elaborei um trabalho sobre Sintra e Cascais para a cadeira de História Urbana Medieval, assim como outro para a cadeira de História da Marinha, sobre os portos de Colares, Touro e Cascais, pode ser que me tenha escapado algo.

O Alto da Vigia é um sítio de grande importância, sem dúvida, mas as interpretações ainda estão muito centradas no santuário e no período romano. A área onde se insere, quanto mais relacionada com a história local em longa duração e com as diferentes condições meteorológicas e oceanográficas atrás referidas – ainda que esta ideia pareça não ser consensual entre os investigadores da Antiguidade –, melhor será compreendida, até no contexto das navegações, pelo que estes são aspectos que devem ser enfatizados e explorados.

Olhando outro aspecto, tem sido referido que a descoberta de epígrafes romanas no Alto da Vigia, em 1505, coincidiu com a construção de uma vigia manuelina (até há pouco tempo interpretada como sendo um facho). No entanto, em 2017, avancei com a hipótese de que essa estrutura poderia ser mais antiga, sendo que o acontecimento de 1505 talvez estivesse relacionado apenas com obras de reparação/reformulação daquela estrutura. Eis mais um trecho do referido post, desta vez atestando o que acabou de ser dito:

“Ou seja, no sítio que desde 2008 está a ser alvo de intervenções arqueológicas, tendo a descoberta de 1505 coincidido com as obras de construção da vigia[8] acima referida ou que ou apenas com trabalhos de reparação/reformulação após uma possível destruição causada pelos sismos que terão ocorrido em 1504-1505. Estes sismos terão provocado estragos na torre defensiva que D. João II mandou construir em Cascais, por volta de 1494, e nas muralhas medievais da vila, pelo que poderá muito bem ter acontecido o mesmo em edificações da área costeira de Sintra. Terá sido neste sentido que o monarca ordenou que se reunissem meios monetários para que essas estruturas cascalenses entrassem em reparação, coincidindo assim com a altura das informações escritas por Valentim Fernandes, sendo que o documento que o comprova é de 12 de Agosto de 1505[9], três dias depois do achado no Alto da Vigia. Outros sismos ocorridos em anos posteriores, 1512, 1527, 1528 e 1531[10], poderão ter levado a estragos na estrutura do Alto da Vigia e a consequentes reparos que tenham implicado reformulações e alterações”.

Confesso que o titulo do post que escrevi sobre o Alto da Vigia poderia ser mais preciso, até porque ali não foi abordado o período islâmico, algo que inicialmente era para ter sido feito. Porém, quem tiver a oportunidade de ler o artigo que deu origem ao post e os meus outros trabalhos sobre Colares vai perceber melhor o que aqui tenho referido[11].

Por fim, resta dizer que, mais do que olhar para as questões do Alto da Vigia, o conteúdo do texto de José d’Encarnação revela uma atitude depreciativa e de pretensa superioridade moral e intelectual. Infelizmente, em certas áreas do conhecimento em Portugal – e não só –, o trabalho de investigadores mais jovens continua a ser desvalorizado, “invisível”, omitido. Aparecer e falar sobre um assunto, acrescentar algo, discordar do conhecimento produzido a nível institucional ou pôr em causa as ideias de uma “autoridade” académica, continua a ser visto – por alguns – como que uma falta de respeito ou até mesmo um crime de lesa-magestade. Mesmo que as instituições e as supostas autoridades possam, de certo modo, estar a fazer passar informações incompletas, desactualizadas ou erradas sobre um determinado tema. Parece que a melhor ou a única opinião tem de ser a mais antiga, sendo que o factor “idade” continua a pesar numa forma de pensar muito gasta e que, apesar de dissimulada, ainda se faz sentir com expressões do género: “quando cá cheguei vocês ainda não eram nascidos”. Contudo, as melhores hipóteses não são as mais antigas ou as mais recentes, mas sim aquelas que nascem da discussão e são melhor fundamentadas. O conhecimento está em constante reinterpretação, são sempre importantes novos contributos e existem princípios éticos que devem ser universais e intemporais, não apenas quando convém!

Marco Oliveira Borges | 2020

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[1] Marco Oliveira Borges, “Paisagem cultural marítima de Sintra: uma abordagem histórico-arqueológica”, in Pedro Fidalgo (coord.), Estudos de paisagem, vol. III, Lisboa, Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, 2017, pp. 230-272 (https://tinyurl.com/yatmhrxn).

[2] Idem, “O Alto da Vigia no tempo dos romanos: uma interpretação alternativa sobre este sítio arqueológico”, 2020 (https://tinyurl.com/yb3nmvjj).

[3] José d’Encarnação e Guilherme Cardoso, “O sítio arqueológico do Espigão das Ruivas (Cascais)”, Arqueologia em Portugal. 2017 – Estado da questão, Lisboa, Associação dos Arqueólogos Portugueses, 2017, pp. 958-959.

[4] Maria Teresa Caetano, Colares, Sintra, Câmara Municipal de Sintra, 2000 [2.ª ed. revista, 2016].

[5] J. M. Alveirinho Dias, “A história da evolução do litoral português nos últimos vinte milénios”, in António Augusto Tavares, Maria José Ferro Tavares e João Luís Cardoso (eds.), Evolução geohistórica do litoral português e fenómenos correlativos. Geologia, História, Arqueologia e Climatologia. Actas do Colóquio. Lisboa, 3 e 4 de Junho de 2004, Lisboa, Universidade Aberta, 2004, pp. 165 e 167; António M. Monge Soares, “Identificação e caracterização de eventos climáticos na costa portuguesa, entre o final do Plistocénico e os tempos históricos – o papel do radiocarbono”, in Evolução geohistórica […], p. 194.

[6] Ana Margarida Arruda e Raquel Vilaça, “O Mar Grego-Romano antes de Gregos e Romanos: perspectivas a partir do Ocidente Peninsular”, in Francisco de Oliveira, Pascal Thiercy e Raquel Vilaça (coords.), Mar Greco-Latino, Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2006, p. 35.

[7] Cf. Avieno, Orla Marítima, Coimbra, Instituto Nacional de Investigação Científica/Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra, 1992, pp. 22 e 47, n. 34.

[8] Alexandre Marques Gonçalves, Escavação arqueológica do Alto da Vigia (Colares-Sintra): relatório da intervenção realizada em 2015, 2016, p. 10 [policopiado]; José Cardim Ribeiro, “Ad Antiquitates Vestigandas. Destinos e itinerários antiquaristas nos campos olisiponenses ocidentais desde inícios a meados do século XVI”, in Gerard González Germain (coord.), Peregrinationes ad inscriptiones colligendas. Estudios sobre epigrafía de tradición manuscrita, Bellaterra, Universitat Autònoma de Barcelona, 2016, p. 140.

[9] Cf. Jaime D’Oliveira Lobo e Silva, Anais da vila da Ericeira. Registo cronológico de acontecimentos referentes à mesma vila, desde 1229 até 1943, 3.ª ed., Mafra, Câmara Municipal de Mafra, 2002, p. 24; Marco Oliveira Borges, “A torre defensiva que D. João II mandou construir em Cascais: novos elementos para o seu estudo”, História. Revista da FLUP, IV: 5, 2015, pp. 106-108.

[10] Idem, ibidem, p. 108.

[11] Cf., e.g., Marco Oliveira Borges, “A importância estratégica do conhecimento do território na formação de um sistema defensivo: o caso de Sintra (Portugal) durante o Período Islâmico”, Anuario de Historia Regional y de las Fronteras, vol. 22, n.º 2, Bucamaranga, 2017, pp. 26-27 (https://tinyurl.com/ya49odpb); idem, “Navegação comercial fluvio-marítima e povoamento no Ocidente do Municipium Olisiponense: em torno dos rios Lizandro (Mafra) e Colares (Sintra)”, in Carmen Soares, José Luís Brandão e Pedro C. Carvalho (coords.), História Antiga: relações interdisciplinares. Paisagens urbanas, rurais e sociais, Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, pp. 219-255 (https://tinyurl.com/y9ugo9qe).

Estela epigrafada em árabe descoberta em Sines

Paula Pereira
Fig. 1 – Inscrição árabe descoberta no castelo de Sines. Fotografia: Paula Pereira.

Em 2008, durante obras de recuperação do castelo de Sines, foi descoberta uma estela epigrafada em árabe. Tal aconteceu durante a abertura do acesso dessa fortificação ao actual edifício de recepção aos visitantes. A descoberta é de enorme importância para a história desta cidade portuária, até porque durante muito tempo foi dito que o local não tinha nada do tempo de ocupação muçulmana. Crê-se que esta estela poderá ser a pedra fundacional de uma rábita construída em 1009. Este tipo de edifícios tinham funções religiosas, mas também de vigilância e de defesa do território.

Já em 2017, no âmbito de participação num colóquio de História de Sines, tivemos a oportunidade de visitar o museu arqueológico local e de ver a estela epigrafada. Desde essa altura que estávamos para escrever um texto sobre o assunto, contando ajudar a divulgar esta magnífica descoberta, embora tenhamos ficado pela elaboração de um texto geral sobre a referida visita e o acontecimento do colóquio (https://tinyurl.com/ydzyxfxh). Nessa altura, devido à fraca qualidade das fotografias tiradas à estela, mal se vendo a inscrição árabe, optou-se por não se colocar no post publicado neste blog. Embora o seu estudo ainda não esteja finalizado, eis a leitura provisória que Ana Labarta fez da epígrafe árabe:

“[… esta] rábida para que seja mencionado (o nome de Deus), se Deus quiser. E isso (foi) no mês de / Ramadão do ano 399 […] / Deus […] / […]”.

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Fig. 2 Pormenor do castelo de Sines. Fotografia: Marco Oliveira Borges (2017).

O ano 399 da Hégira corresponde a 1009. A parte final da epígrafe é de cariz religioso, mas ainda não foi revelada.

Apesar do negacionismo que andou associado à presença islâmica em Sines, Cláudio Torres já havia colocado a hipótese de que Sines poderia corresponder à antiga cidade portuária muçulmana de Marsa Hashim, a qual é mencionada por al-Himyari, autor do século XIII que se baseou em escritos mais antigos. Marsa, em árabe, significa porto, enquanto que Sines/Hashim deriva do latim sinus, baía. Ora, Sines localiza-se numa baía protegida, oferecendo um bom local de ancoradouro.

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Fig. 3 – Aspecto da área portuária de Sines. Fotografia: Marco Oliveira Borges (2017).

O exemplo de Sines é bastante importante e deve ser visto em paralelo com outras áreas portuárias, caso de Sintra e Cascais, sendo que relativamente a Sintra foi detectada uma estrutura muçulmana, mais concretamente no Alto da Vigia, que tem sido apresentada pelos arqueólogos locais como sendo um ribat. A primeira estrutura deste tipo a ser detectada no actual território português foi na Arrifana, concelho de Aljezur. Num texto publicado há poucas horas atrás, abordando Sines durante o período islâmico, o arqueólogo Santiago Macias pôs precisamente em paralelo estas descobertas.

Marco Oliveira Borges | 2020

Bibliografia: Cláudio Torres, “O Garb al-Andaluz”, in José Mattoso (dir.), História de Portugal, vol. I, [s.l.], Editorial Estampa, 1997, pp. 353-354; Paula Pereira e Sandra Patrício, Sines, a Terra e o Mar, Sines, Câmara Municipal de Sines, 2017, pp. 55-56; Marco Oliveira Borges, “A importância estratégica do conhecimento do território na formação de um sistema defensivo: o caso de Sintra (Portugal) durante o Período Islâmico”, Anuario de Historia Regional y de las Fronteras, vol. 22, n.º 2, Bucamaranga, 2017, pp. 17-48; Santiago Macias, “Sines – ali não há nada do período islâmico…”, Diário do Alentejo, 27/06/2020; http://www.sines.pt/pages/396?news_id=714 (consultado a 27/06/2020).

Marégrafo de Cascais

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Marégrafo de Cascais. Fotografia: Marco Oliveira Borges (2011).

Adquirido a 23 de Março de 1877, pela Direcção-Geral dos Trabalhos Geodésicos, Topográficos, Hidrográficos e Geológicos do Reino, pela quantia de 2.519 francos franceses a uma oficina de Paris, credenciada pela qualidade tecnológica dos seus relógios horizontais ou de edifício, o Marégrafo de Cascais (ou de Borrel) havia de ser instalado somente dois anos depois, no passeio D. Maria Pia, junto ao forte da Cidadela[1]. Após a sua instalação seguiu-se uma fase de montagem, construção da casa abrigo, para além da realização de variados testes, pelo que só veio a iniciar o seu funcionamento regular em 1882. Por esta altura, apenas três locais detinham semelhante equipamento: Brest (França), Aberdeen (Escócia) e Hoek Van Holland (Holanda).

A necessidade de aquisição deste marégrafo – da autoria do francês Amédée-Philippe Borrel (1818-1887) – obedece à lógica da conjuntura internacional da época, onde o desenvolvimento do conhecimento científico era uma constante. No caso português, surgiu da urgência de registar as alturas do nível do mar fora da barra de Lisboa e de definir o zero altimétrico para Portugal continental, necessário para a navegação e para os trabalhos de cartografia e hidrografia que se pretendiam realizar sobre portos e rios portugueses, sendo que a localização privilegiada da enseada de Cascais ditou o local escolhido para a sua colocação. Note-se que, até então, o nível do mar era medido através de marémetros ou réguas de maré, feitos de madeira ou de metal, mas que uma vez baseados na observação directa não permitiam um registo contínuo de dados. Todavia, face a problemas de funcionalidade verificados com o assoreamento no poço que fazia parte da estrutura inicial, e que não permitia a obtenção de dados fiáveis, o Marégrafo de Cascais veio a ser deslocado mais para Sul, a 50 metros de distância da primitiva instalação, onde se construiu uma nova casa abrigo e onde se encontra na actualidade (na área adjacente ao Clube Naval de Cascais, junto à Marina local), vindo apenas a iniciar actividade a 28 de Maio de 1895.

Fazendo o registo diário da evolução das marés e das correntes, este é o primeiro marégrafo analógico a surgir em Portugal – o de Lagos só iniciaria actividade em 1908 – e o único que ainda se encontra em actividade. Este mecanismo funciona com uma boía colocada num poço, em contacto directo com o mar, e cujo movimento é transmitido por um sistema de cabos e roldanas ligados a uma caneta que faz o registo das variações do nível da água numa folha de papel quadriculada, envolvida num tambor rotativo. Com efeito, essa caneta regista a amplitude consoante o movimento da maré, construindo assim um gráfico designado por maregrama. O marégrafo tem uma autonomia de quatro dias e a cada 24 horas o tambor dá uma volta completa, registando assim duas preia-mares e duas baixa-mares.

Há mais de 120 anos que os seus registos são enviados regularmente para o serviço internacional Permanent Service for Mean Sea Level (Reino Unido), organismo que disponibiliza, numa base de dados à escala mundial, estes e outros registos similares, utilizados em diversos programas científicos. De acordo com os dados obtidos entre 1882 e 2000, a tendência foi para uma subida do nível médio das águas do mar nesta região na ordem dos 1.3 mm/ano, cerca de 15 cm no total. Para além disso, é de salientar que o Marégrafo de Cascais veio a definir a referência do Datum Altimétrico, Zero Cartográfico, para o território continental através do cálculo da média dos níveis médios do mar realizado entre 1882 e 1938, tendo por denominação “Cascais, Helmert 1938”.

A 31 de Dezembro de 1997, foi classificado imovél de interesse público. Na actualidade, encontra-se sob tutela do Instituto Geográfico Português, entidade responsável pela recolha de informação dos valores do nível médio do mar e pela determinação do Datum Altimétrico Nacional. Embora exista, desde 2003, um marégrafo acústico e digital instalado na Marina de Cascais, mais preciso e sofisticado, o antigo marégrafo continua activo, sendo que em finais de 2005 o Instituto Geográfico Português celebrou um protocolo com a Câmara Municipal de Cascais visando a sua conservação e divulgação. Assim, o Marégrafo de Cascais passou a integrar o roteiro histórico desta vila associado à obra cientifica do rei D. Carlos, estando aberto ao público mediante marcação de visita.

Marco Oliveira Borges | 2020

Bibliografia: Marégrafo de Cascais, 1882, [s.l.], Instituto Geográfico Português, Março de 2007; Marégrafo de Cascais. Um Instrumento Centenário de Amédée-Philippe Borrel – 1877, [s.l.], Instituto Geográfico Português, 2009.

[1] Texto adaptado de Marco Oliveira Borges, “Marégrafo de Cascais”, in Dicionário de História Marítima, 2011 (em trânsito para uma nova plataforma online).

O Alto da Vigia no tempo dos romanos: uma interpretação alternativa sobre este sítio arqueológico

Fig. 1
Fig. 1 – Vista aérea da praia das Maçãs, Alto da Vigia e praia Pequena (ou da Vigia).

O Alto da Vigia é um pequeno outeiro que fica situado junto à praia das Maçãs, na margem esquerda da desembocadura do rio de Colares, curso de água que nasce a c. 14 km da sua foz, estando actualmente reduzido à condição de ribeira[1]. Em épocas passadas, um esteiro de mar invadia esta área permitindo a navegabilidade do vale de Colares, o acesso naval ao interior do território e ao porto local[2].

Em 2008, durante intervenções arqueológicas realizadas no Alto da Vigia que visavam averiguar a existência do santuário romano consagrado ao Sol, à Lua e ao Oceano que se sabia ter existido no litoral de Sintra, foram detectados importantes vestígios de diferentes cronologias, inicialmente associados a uma vigia[3], porquanto parte da sua estrutura ainda estava visível à superfície[4]. O decorrer dos trabalhos tem permitido confirmar que foi neste local que os romanos tiveram o dito santuário. No entanto, a grande surpresa arqueológica esteve na detecção parcial de estruturas muçulmanas que os arqueólogos locais têm vindo a interpretar como sendo pertencentes a um ribat[5].

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Fig. 2 – Mihrab presente numa das salas da edificação muçulmana. Fotografia: Marco Oliveira Borges (2016)

Os trabalhos arqueológicos ainda decorrem. Até ao momento, comprova-se a presença romana nesse sítio desde o século I d.C., altura em que terá sido fundado o famoso santuário consagrado ao Sol Eterno, à Lua e ao Oceano. A julgar pelos testemunhos epigráficos recolhidos nos últimos anos, terá sido muito provavelmente ainda na primeira metade do século I d.C., talvez durante o imperialato de Tibério[6]. Este espaço de culto, a dada altura, foi “integrado no âmbito do Culto Imperial, sendo os votos expressos – designadamente pela saúde do Imperador e eternidade do Império – colocados apenas por governadores da Lusitânia e legados imperiais, e não por devotos particulares, ou mesmo pelo senado de Olisipo, município em cujo território se localizava o santuário”[7].

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Fig. 3 – Outro pormenor da mesma edificação, observando-se melhor uma ara romana que foi usada como elemento pétreo na sua construção.  Fotografia: Marco Oliveira Borges (2016)

A alegada representação do santuário, que vinha indicado em epígrafes votivas[8] e que chegou a ser referido como podendo integrar um vicus local[9], viria a ser desenhada e descrita em texto corrido numa obra da autoria de Francisco de Holanda, publicada em 1571[10], se bem que a sua visita ao local tenha sido por volta de 1540 ou 1541[11]. Aquilo que Holanda apresenta no seu esboço não é propriamente um edifício, mas sim um alinhamento circular composto por 16 aras ou plintos, ainda que suscitando dúvidas[12] quanto à real configuração e até à sua existência. Quando Valentim Fernandes visitou o Alto da Vigia, em Agosto de 1505, no âmbito da recente descoberta de elementos arquitectónicos romanos, não referiu nenhum edifício naquele formato, somente a descoberta de três aras soterradas. Eis o que o humanista indicou ter sido encontrado nesse local:

“No ano do nascimento de Cristo de 1505, no dia 9 de Agosto, reinando D. Manuel, excelentíssimo rei de Portugal, quási no décimo ano do seu reinado, nas terras extremas dos confins da Espanha, para o lado do ocidente, na extremidade do promontório da Lua (Serra de Sintra) a que o vulgo chama Roca de Sintra [Cabo da Roca] à beira da praia do oceano, inesperadamente foram encontradas, debaixo de terra, três colunas de pedra, de forma quadrada, tendo gravados, desde tempos antigos, alguns caracteres romanos apenas em uma das faces, cuja base, mudada a ordem natural, se elevava como capitel e cujo capitel vimos fixado propositadamente, ao que parecia, como se fosse a base. Arrancadas a ferro e com cuidado, dentre os tijolos e pedras duras com que se fixavam por baixo as admiráveis colunas cima referidas, então notámos perfeitamente em uma delas, já voltada direitamente, estas figuras seguintes, não nos sendo possível decifrar com clareza as letras das outras porque, com a antiguidade do tempo e o desgaste do mar e das chuvas, estavam quási apagadas”[13].

Valentim Fernandes prossegue a sua descrição fornecendo a respectiva inscrição latina de uma das aras, se bem que dizendo que a leitura fora realizada pelo supremo secretário do rei, que, na presença do próprio D. Manuel I, fez o melhor que conseguiu para decifrá-la[14].

Em que área exacta do Alto da Vigia foram descobertos os elementos arquitectónicos romanos referidos por Valentim Fernandes? As três aras epigrafadas ali descobertas, que vieram a ser reaproveitadas na construção do suposto ribat[15], terão sido detectadas num espaço um pouco mais a Sul daquele que é indicado no esboço de Holanda. Ou seja, no sítio que desde 2008 está a ser alvo de intervenções arqueológicas, tendo a descoberta de 1505 coincidido com as obras de construção da vigia[16] acima referida ou apenas com trabalhos de reparação/reformulação após uma possível destruição causada pelos sismos que terão ocorrido em 1504-1505. Estes sismos terão provocado estragos na torre defensiva que D. João II mandou construir em Cascais, por volta de 1494, e nas muralhas medievais da vila, pelo que poderá muito bem ter acontecido o mesmo em edificações da área costeira de Sintra. Terá sido neste sentido que o monarca ordenou que se reunissem meios monetários para que essas estruturas cascalenses entrassem em reparação, coincidindo assim com a altura das informações escritas por Valentim Fernandes, sendo que o documento que o comprova é de 12 de Agosto de 1505[17], três dias depois do achado no Alto da Vigia. Outros sismos ocorridos em anos posteriores, 1512, 1527, 1528 e 1531[18], poderão ter levado a estragos na estrutura do Alto da Vigia e a consequentes reparos que tenham implicado reformulações e alterações.

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Fig. 4 – Esboço circular de Francisco de Holanda.

Está ainda por demonstrar arqueologicamente se o esboço de Francisco de Holanda era fidedigno e se, assim sendo, não teria resultado de uma elaboração circular quinhentista posterior à visita de Valentim Fernandes ao Alto da Vigia, inserindo-se no âmbito dos humanistas tentarem recuperar o passado clássico, podendo a alegada representação do santuário ter ganho forma através de outros exemplos construtivos da Romanidade, se bem que com alguns elementos pétreos desse tempo[19]. Por outro lado, um santuário nem sempre pressuponha a existência de uma construção, podendo tratar-se apenas de um local sacralizado. Em todo o caso, estando-se perante um “marcador natural” utilizado para fins cultuais, este podia anteceder a construção de um templo[20]. Mas um santuário também podia ser entendido como um espaço delimitado[21] no qual se integrava um conjunto de edifícios[22], o que poderá ter sido o caso do Alto da Vigia.

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Fig. 5 – Pormenor dos níveis estratigráficos observados no Alto da Vigia (2013). Fotografia: Marco Oliveira Borges

Para o caso específico deste sítio, a arqueologia tem vindo a comprovar a existência de estruturas romanas e de uma presença em larga diacronia com várias fases de ocupação, ainda que subsistindo diversas dúvidas sobre a sua caracterização. Evidências relacionadas com a fase alto-imperial romana estão documentadas através de um conjunto de estruturas negativas, algumas ulteriormente usadas na edificação de uma aedicula durante a segunda metade do século IV d.C.[23]. A dita aedicula, que se encontra em mau estado de preservação devido à remoção de elementos pétreos para a construção da estrutura islâmica[24], é um edifício que funcionava como pequeno templo[25]. Junto a esta estrutura, associada a materiais dos séculos III-IV e inícios do V d.C., foram recolhidas várias moedas e fragmentos de lucerna, ainda que em diferentes níveis estratigráficos e afectados por acções antrópicas[26]. Alguns elementos lapidares reutilizados na edificação da aedicula demonstram “que a continuidade em funcionamento do santuário em época tardia implicou a reformulação do espaço e das estruturas que o constituíam” [27]. Contudo, somente a continuidade dos trabalhos e a identificação e escavação de outros contextos romanos poderão ajudar a caracterizar a complexa dinâmica de ocupação romana deste local[28].

De qualquer forma, é muito provável que a área do Alto da Vigia e imediações, com larga extensão, tenham tido igualmente outras funcionalidades para além daquelas associadas ao santuário. Em tempos recuados, poderá mesmo ter havido uma extensão habitável. Essa situação seria facilitada por condições meteorológicas e oceanográficas mais aprazíveis à fixação costeira do que na actualidade, sendo na altura caracterizadas, nomeadamente, pela menor intensidade de vento e de agitação marítima. Isso deveu-se à fraca presença de upwelling no Ocidente ibérico[29], traduzindo-se esse factor, efectivamente, na parca intensidade da nortada e menor altura das ondas em relação ao que no presente se verifica[30], se bem que não se possa falar numa total ausência de vento[31]. Por outro lado, é possível que possa ter havido algum tipo de exploração económica romana nessa área, fosse ligada à terra ou ao mar. O mesmo se pode pensar nalgum tipo de edifício de apoio à navegação, talvez até um posto de controlo romano do acesso naval ao interior de Sintra. Recorde-se que em pleno século I d.C., altura em que os romanos terão construído o dito santuário, o esteiro de Colares era navegável, constituindo-se assim como um canal privilegiado de comunicação e ligação naval com o interior do território.

Marco Oliveira Borges | 2020

[1] Este artigo, embora com ligeiras modificações, foi adaptado de um estudo mais alargado: Marco Oliveira Borges, “Paisagem cultural marítima de Sintra: uma abordagem histórico-arqueológica”, in Pedro Fidalgo (coord.), Estudos de paisagem, vol. III, Lisboa, Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, 2017, pp. 250-255.

[2] Marco Oliveira Borges, “A defesa costeira do litoral de Sintra-Cascais durante o Garb al-Ândalus. I – Em torno do porto de Colares”, História. Revista da FLUP, IV: 2, 2012, pp. 116-128; idem, “Portos e ancoradouros do litoral de Sintra-Cascais. Da Antiguidade à Idade Moderna (I)”, Actas das Jornadas do Mar 2014. Mar: Uma onda de Progresso, Almada, Escola Naval, 2015, pp. 152-160; Maria Teresa Caetano, Colares, 2.ª ed., Sintra, Câmara Municipal de Sintra, 2016, pp. 13-21; Marco Oliveira Borges, “Navegação comercial fluvio-marítima e povoamento no Ocidente do Municipium Olisiponense: em torno dos rios Lizandro (Mafra) e Colares (Sintra)”, in Carmen Soares, José Luís Brandão e Pedro C. Carvalho (coords.), História Antiga: relações interdisciplinares. Paisagens urbanas, rurais e sociais, Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, pp. 233-236.

[3] Até recentemente, foi interpretada pelos arqueólogos como sendo a torre de um facho (cf. Patrícia Jordão, Pedro Mendes e Alexandre Gonçalves, Alto da Vigia (Colares, Sintra). Relatório dos Trabalhos Arqueológicos [de 2008], 2009, pp. 3-4 e 17 [policopiado]; Alexandre Marques Gonçalves, Alto da Vigia (Colares, Sintra). Relatório dos trabalhos arqueológicos de 2013, 2014, pp. 11-12 [policopiado]).

[4] Idem, Escavação arqueológica do Alto da Vigia (Colares-Sintra): relatório da intervenção realizada em 2015, 2016, p. 17 [policopiado].

[5] Idem, ibidem, pp. 7-9, 67 e 70-75.

[6] Idem, ibidem, pp. 7 e 70. Anteriormente, a cronologia de fundação do santuário era apontada para o século II d.C. (cf. José Cardim Ribeiro, “Soli aeterno Lvnae. Cultos astrais em época pré-romana e romana na área de influência da serra de Sintra: ¿um caso complexo de sincretismo?”, Sintria, III-IV, 1995-2007, pp. 607 e 609; idem, “Soli aeterno Lvnae: o santuário”, in Religiões da Lvsitânia. Loquuntur Saxã, Lisboa, Museu Nacional de Arqueologia, 2000, pp. 236-237).

[7] Alexandre Gonçalves, op. cit., p. 7.

[8] José Cardim Ribeiro, “Estudos histórico-epigráficos em torno da figura de L. Iulius Maelo Caudicus”, Sintria, III: I, 1982-1983, p. 166.

[9] Jorge de Alarcão, O domínio romano em Portugal, 4.ª ed., [Lisboa], Publicações Europa-América, 2002, p. 80; Inês Nadal de Sousa Byrne, “A rede viária da zona Oeste do Município Olisiponense (Mafra e Sintra)”, sep. de Al-Madan, II: 2, 1993, 46.

[10] “Outra memória de basas digna de lembrar e de imitar dos fiéis, faziam os antigos e infiéis, como eu vi, quando me o Infante Dom Luís, vosso tio que Deus tem, levou a mostrar a Serra de Sintra, mandando-me para isso chamar a Lisboa, quando vim de Itália. E vimos em a foz do rio de Colares, prezado em outro tempo dos Romanos, sobre um pequeno outeiro junto do mar Oceano, um círculo ao redor cheio de cipos e memórias dos imperadores de Roma que vieram àquele lugar; e cada um punha um cipo com seu letreiro a Sol Eterno e à Lua, a quem aquele promontório foi dos gentios dedicado. O que nós, espiritualmente mudando, podemos converter em cipos os embasamentos dos pés das Cruzes que digo, em louvor e memória do verdadeiro Sol de justiça, Jesus Cristo, e da verdadeira e sempre cheia de graça Santa Maria Nossa Senhora, como se pode considerar deste desenho” (Francisco D’Holanda, Da fábrica que falece à cidade de Lisboa, introd., notas e coment. de José da Felicidade Alves, [Lisboa], Livros Horizonte, 1984, fl. 24v e 25r).

[11] José Cardim Ribeiro, “Ad Antiquitates Vestigandas. Destinos e itinerários antiquaristas nos campos olisiponenses ocidentais desde inícios a meados do século XVI”, in Gerard González Germain (coord.), Peregrinationes ad inscriptiones colligendas. Estudios sobre epigrafía de tradición manuscrita, Bellaterra, Universitat Autònoma de Barcelona, 2016, pp. 142 e 158; Alexandre Gonçalves, op. cit., pp. 5-6.

[12] Jorge de Alarcão, “Colares”, in Dicionário de Arqueologia Portuguesa, Porto, Figueirinhas, 2012, p. 118.

[13] A. Fontoura da Costa, ed., Cartas das ilhas de Cabo Verde de Valentim Fernandes (1506-1508), Lisboa, Agência Geral das Colónias, 1939, pp. 87-88.

[14] Idem, ibidem, p. 88.

[15] Alexandre Gonçalves, op. cit., p. 5.

[16] Idem, ibidem, p. 10; José Cardim Ribeiro, op. cit., p. 140.

[17] Cf. Jaime D’Oliveira Lobo e Silva, Anais da vila da Ericeira. Registo cronológico de acontecimentos referentes à mesma vila, desde 1229 até 1943, 3.ª ed., Mafra, Câmara Municipal de Mafra, 2002, p. 24; Marco Oliveira Borges, “A torre defensiva que D. João II mandou construir em Cascais: novos elementos para o seu estudo”, História. Revista da FLUP, IV: 5, 2015, pp. 106-108.

[18] Idem, ibidem, p. 108.

[19] José Cardim Ribeiro, crendo que tenha existido a representação circular referida por Holanda e apoiado em Sylvie Deswarte-Rosa, embora admitindo que o humanista português deva ter procedido à multiplicação de elementos para conferir maior monumentalidade ao sítio, refere que poderá ter havido inspiração a partir de um exemplo bracarense que se vê numa gravura de 1594. Com efeito, o modelo seguido no Alto da Vigia teria tido inspiração na representação circular dos doze marcos miliários romanos dispostos em torno da ermida de Santa Ana, embora um deles surja tombado, tendo a disposição desses elementos sido executada por ordens de D. Diogo de Sousa em 1506 (cf. Sylvie Deswarte-Rosa, “Le voyage épigraphique de Mariangelo Accursio au Portugal, printemps 1527”, in Maria Berbara e Karl A. E. Enenkel (eds.), Portuguese Humanism and the Republic of Letters, Leiden-Boston, Brill, 2012, p. 78; José Cardim Ribeiro, op. cit., p. 143, n. 8).

[20] Pedro Albuquerque, Tartessos: a construção de identidades através do registo escrito e da documentação arqueológica. Um estudo comparativo. Dissertação de Doutoramento, vol. I, Universidade de Lisboa, 2014, p. 154.

[21] A partir de elementos naturais como, por exemplo, uma montanha, uma fonte, uma árvore, um bosque, um cabo, etc. (idem, ibidem, p. 154).

[22] Idem, ibidem, p. 154.

[23] Alexandre Gonçalves, op. cit., pp. 66-67.

[24] Idem, ibidem, pp. 68-70.

[25] “Edícula”, in Dicionário de Arqueologia Portuguesa, p. 141.

[26] Alexandre Gonçalves, op. cit., pp. 69-70.

[27] Idem, ibidem, p. 70.

[28] Idem, ibidem, p. 70.

[29] J. M. Alveirinho Dias, “A história da evolução do litoral português nos últimos vinte milénios”, in António Augusto Tavares, Maria José Ferro Tavares e João Luís Cardoso (eds.), Evolução geohistórica do litoral português e fenómenos correlativos. Geologia, História, Arqueologia e Climatologia. Actas do Colóquio. Lisboa, 3 e 4 de Junho de 2004, Lisboa, Universidade Aberta, 2004, pp. 165 e 167; António M. Monge Soares, “Identificação e caracterização de eventos climáticos na costa portuguesa, entre o final do Plistocénico e os tempos históricos – o papel do radiocarbono”, in Evolução geohistórica […], p. 194.

[30] Ana Margarida Arruda e Raquel Vilaça, “O Mar Grego-Romano antes de Gregos e Romanos: perspectivas a partir do Ocidente Peninsular”, in Francisco de Oliveira, Pascal Thiercy e Raquel Vilaça (coords.), Mar Greco-Latino, Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2006, p. 35.

[31] Cf. Avieno, Orla Marítima, Coimbra, Instituto Nacional de Investigação Científica/Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra, 1992, pp. 22 e 47, n. 34.

Corso e pirataria no cabo da Roca e suas imediações (séculos XVI-XVII)

Cabo da Roca 1
Fig. 1 – Vista aérea do cabo da Roca.

Designado na Antiguidade por promontório de Ofiússa[1], Promontorium Lunae e Promontorium Magno[2], o cabo da Roca sempre foi um importante acidente geográfico para a navegação, servindo aos mareantes “de firme demarcação para buscarem a barra de Lisboa”[3]. Situado na área mais ocidental do mundo conhecido, caracterizada pelo forte vento e agitação marítima, este cabo, efectivamente, desde cedo foi o grande ponto de referência da costa de Sintra e da região que abarca, conhecidas pela sua perigosidade e pelos diversos naufrágios que proporcionaram ao longo dos séculos, sendo que a primeira referência documental que se conhece sobre acidentes marítimos no litoral sintrense remete para 1147[4].

Fig. 8
Fig. 2 – Outra vista área do cabo da Roca.
Fonte: https://www.e-cultura.sapo.pt//patrimonio_item/2513

Relativamente às actividades de corso/pirataria, os casos mais antigos que se conhecem estiveram associados a salteadores franceses, entre 1520 e 1537, se bem que alguns não tenham ocorrido propriamente em águas sintrenses, mas umas léguas mais ao largo, aparecendo o cabo da Roca como local de referência nas fontes históricas[5]. No entanto, sabe-se que este local, assim como as suas imediações, inclusive para Sul, envolvendo a área ao largo da enseada de Assentis e até à zona do Alto das Entradas, foram usados por inimigos que esperavam estrategicamente a vinda de navios ricamente carregados[6]. Não se pode esquecer, entre várias rotas que por ali passavam, que esta era uma das áreas de aproximação à costa para os navios que vinham dos Açores, onde se incluíam os que vinham da Índia, do Brasil, de África e de outras partes, pelo que acabava por ter grande procura. É bem provável que, conforme nos referiu Miguel Lacerda, os corsários/piratas fizessem sair gente em terra para, em posições altas, poderem controlar as movimentações da navegação. Além disso, existe uma ribeira que desagua junto ao cabo da Roca, a qual poderá ter sido usada para se obter água. Estas deslocações a terra seriam efectuadas em pequenas embarcações largadas dos navios.

Fig. 11
Fig. 3 – Cabo da Roca, também designado como The Rock of Lisbon.
Fonte: John Christian Schetky, 1861 (NMM).

Fig. 1 –
Fig. 4 – Cabo da Roca com vista parcial para a Enseada de Assentis e imediações.
Fotografia: Marco Oliveira Borges.

Foi nas proximidades da Enseada de Assentis, mais precisamente no Alto das Entradas ou Calhau das Entradas (sítio caracterizado por ser uma área de penhascos e de altura considerável em relação ao mar), que após a Restauração foi edificado o Forte de Nossa Senhora da Roca (ou Forte do Espinhaço)[7], do qual já só subsistem escassos vestígios das suas ruínas (fig. 7). De acordo com as investigações de Carlos Callixto, um inspector anónimo havia visitado o local em Abril de 1751, altura em que o forte já se encontrava bastante arruinado, ficando estimado que a sua reconstrução total orçaria pelos 1.300$00 réis.

À primeira vista, a importância para defender os navios de menor porte que por ali passavam, bem como a própria presença de corsários naquelas imediações e a necessidade de evitar que pairassem por ali, foram  argumentos mais do que válidos para se erguer um forte naquela área. Assim, de acordo com o dito inspector, o Forte de Nossa Senhora da Roca estava “num dos sítios mais importantes daquela marinha pelo muito que ampara dos inimigos as embarcações pequenas que fazem viagem para o Norte”[8].

Fig. 13
Fig. 5 – Forte da Roca numa gravura da segunda metade do século XIX.

Não se sabe por quantas peças de artilharia estava dotado em 1751. Porém, anos mais tarde, entre 1763 e 1764, sabe-se que estava artilhado com 4 peças de ferro: 2 de calibre 9 e 2 de calibre 6[9]. Todavia, os relatórios levados a cabo nas décadas seguintes viriam a tirar a importância estratégica e a utilidade defensiva deste forte. Em 1777, um oficial alegou que o “Forte não he de nenhuma utilidade, e assim só lhe bastão duas peças para servir de vigia. O paiol da pólvora está em bom estado. Para guarnecer esta fortaleza em tempo de guerra, no cazo que seja acommetida por alguma frota inimiga, bastar-lhe-ha ao menos um Cabo e oito artilheiros; presentemente se acha guarnecida por hum Cabo e trez Soldados infantes”[10]. Em 1796, num novo relatório, a importância da fortificação foi considerada “quaze inútil pois não defende porto algum e os seus tiros são tão mergulhantes que não poderão fazer efeito, por estar levantado sobre o plano do mar alguns 300 palmos; e além disto todos os navios se apartão deste Cabo [da Roca] por não darem a Costa”[11]. Por fim, num relatório de 1831 foi referido que não era “possível com o fogo feito da bateria deste Forte incomodar o inimigo, devido à sua grande altura sobre o mar”[12].

Em todo o caso, apesar da curta duração que teve e de se ter verificado a sua inutilidade para a defesa marítima dessa área, a verdade é que a intenção inicial que esteve por detrás da construção do forte estaria mesmo na necessidade de protecção dos navios de menor porte que se abrigavam de corsários naquelas enseadas e imediações. Talvez o poder de fogo que o forte dispunha acabou por ter um efeito mais dissuasor para os navios inimigos que se aventuravam por aquelas paragens do que propriamente operativo.

Fig. 14
Fig. 6 – Planta do forte de Nossa Senhora da Roca (ANTT).

De qualquer forma, tal como nos deixam perceber vários tipos de fontes, não há qualquer dúvida de que se estava perante uma área movimentada e que, apesar de bastante perigosa, era paragem frequente para piratas e corsários. De acordo com Manoel Pimentel, por exemplo, “na ponta desta Roca distante de terra o tiro de hum mosquete está huma baixa em que arrebenta o mar. Por entre a baixa, e a Roca tem ja passado navios pequenos fugindo dos Mouros, encostando-se mais à baixa que à Roca”[13]. Esta seria uma referência à Baixa do Broeiro (situada a cerca de 900 m a Noroeste do cabo da Roca), ou a outro rochedo das imediações, ficando o contínuo testemunho quanto à presença de piratas e de corsários nesta área sintrense, bem como de esta servir de refúgio a navios de menor porte que, liderados por mareantes conhecedores da geografia local, poderiam usar a presença dos rochedos à flor da água como armadilha para se defenderem da agressão de navios maiores. O embate contra os rochedos seria um naufrágio quase certo naquele local, sendo que na Baixa do Broeiro existe um navio naufragado e canhões submersos[14].

Fig. 15
Fig. 7 – Ruínas do Forte de Nossa Senhora da Roca (ou do Espinhaço) com vista para o Cabo da Roca, Enseada de Assentis e imediações (foto: André Manique).

Por fim, há que referir o ataque ao patacho Nossa Senhora da Conceição, do qual se sabe muito pouco. Referida como urca e patacho, havia velejado para a Índia em Abril de 1635, juntamente com as naus Santa Catarina de Ribamar e Nossa Senhora da Saúde. Sob capitania de João da Costa, que também ia como piloto, fez escala em Moçambique, onde largou 50 homens, e surgiu em Goa a 6 de Novembro, tendo iniciado o retorno a Portugal algures em 1637[15].

Uma vez na costa de Sintra, mais concretamente na área próxima do rio das Maçãs e já pelo dia 17 de Dezembro, entrou em combate e foi queimada por 4 navios de corsários muçulmanos[16]. Ainda que a historiografia tenho vindo a seguir as indicações de  Saturnino Monteiro, e nós próprios, em outros estudos, tenhamos colocado a hipótese mais concreta de João da Costa ter sofrido uma emboscada junto à enseada de Assentis[17], a verdade é que não se sabe ao certo o desenrolar dos acontecimentos. No entanto, o navio terá ido ao fundo perto da praia das Maçãs.

Marco Oliveira Borges | 2020

[1] Avieno, Orla Marítima, Coimbra, Instituto Nacional de Investigação Científica/Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra, 1992, pp. 22 e 47, n. 33.

[2] Vasco Gil Mantas, A rede viária romana da faixa atlântica entre Lisboa e Braga. Tese de Doutoramento, vol. I, Universidade de Coimbra, 1996, p. 882; idem, “O porto romano de Lisboa”, in G. P. Berlanga e J. P. Ballester (coords.), Puertos fluviales antiguos: ciudad, desarrollo e infraestructuras, Valência, Universidad de Valencia, 2003, p. 15.

[3] Fr. Joseph Pereira de Santa Anna, Chronica dos Carmelitas da Antiga, e Regular Observancia Nestes Reynos de Portugal, Algarves e seus Domínios, t. II, Lisboa, Officina dos Herdeiros de Antonio Pedrozo Galram, 1751, p. 115.

[4] Altura em que as forças cruzadas vieram auxiliar D. Afonso Henriques na tomada de Lisboa aos muçulmanos (cf. Marco Oliveira Borges, “Em torno da preparação do cerco de Lisboa (1147) e de uma possível estratégia marítima pensada por D. Afonso Henriques”, História. Revista da FLUP, IV: 3 (2013), pp. 126-129).

[5] Idem, “Corso e pirataria na costa de Sintra durante os séculos XVI-XVII”, comunicação apresentada no V Encontro de História de Sintra (Sintra, 28/10/2016); idem, O trajecto final da carreira da Índia na torna-viagem (1500-1640). Problemas à navegação entre os Açores e Lisboa: acções e reacções, Lisboa, Tese de Doutoramento, 2 vols., Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (a aguardar defesa).

[6] Idem, “Portos e ancoradouros do litoral de Sintra-Cascais. Da Antiguidade à Idade Moderna (I)”, in Jornadas do Mar 2014. Mar: uma onda de progresso, Almada, Escola Naval, pp. 162-163; idem, Paisagem cultural marítima de Sintra: uma abordagem histórico-arqueológica”, in Pedro Fidalgo (coord.), Estudos de paisagem, vol. III, Lisboa, Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, 2017, pp. 243-250.

[7] Carlos Callixto, Fortificações da Praça de Cascais a Ocidente da Vila, sep. da Revista Militar, Lisboa, 1980, pp. 4-5.

[8] Joaquim Boiça, Maria Rombouts de Barros, Margarida de Magalhães Ramalho, As Fortificações Marítimas da Costa de Cascais, Cascais, Quetzal, 2001, p. 212.

[9] Carlos Callixto, op. cit., pp. 5-6.

[10] Joaquim Boiça, Maria Rombouts de Barros, Margarida de Magalhães Ramalho, op. cit., p. 212.

[11] Idem, ibidem, p. 213.

[12] Carlos Callixto, op. cit., p. 8.

[13] Manoel Pimentel, Arte de Navegar, em que se ensinam as regras praticas, e os modos de cartear, e de graduar a balestilha por via de Numeros e muitos problemas úteis à navegação, Lisboa, Officina de Francisco da Silva, 1762, p. 526.

[14] Paulo Alexandre Monteiro, “Canhões na Roca. Análise preliminar de um conjunto submerso de peças de artilharia”, in Al-Madan, sér. II, t. 15, 2007, p. 159; idem, “O património cultural subaquático da costa de Sintra” (Sintra, 02/08/2014).

[15] Relações da carreira da Índia. Navios da carreira da Índia (1497-1653), códice anónimo da British Library. Governadores da Índia, pelo Pe. Manuel Xavier, Lisboa, Publicações Alfa, 1989, pp. 85 e 166-167; Memórias das armadas da Índia. Org., introd. e notas de João C. Reis, Macau, Edições Mar-Oceano, 1990, p. 271; Paulo Guinote, Eduardo Frutuoso e António Lopes, As armadas da Índia, 1497-1835, Lisboa, Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 2002, p. 169.

[16] BNP, Ms. 26, 153, n.º 129; Relações da carreira […], pp. 166-167; Memorias das armadas […], p. 271.

[17] Saturnino Monteiro, Batalhas e combates da marinha portuguesa, vol. VI, Lisboa, Livraria Sá da Costa Editora, 1995, p. 152; José António Rodrigues Pereira, Grandes batalhas navais portuguesas. Os combates que marcaram a História de Portugal, Lisboa, A Esfera dos Livros, 2009, pp. 193-195; idem, Grandes naufrágios portugueses, 1194-1991. Acidentes marítimos que marcaram a História de Portugal. Pref. de Adolfo Silveira Martins, Lisboa, A Esfera dos Livros, 2013, pp. 204-205; Marco Oliveira Borges, “Portos e ancoradouros […]”, p. 162; idem, “Paisagem cultural marítima […]”, pp. 245-247.

Videoclipe o “Mar de Cascais”

 

Aproveitei algum do meu tempo de quarentena para fazer este videoclipe instrumental sobre o “Mar de Cascais”. Para tal, usei imagens de arquivo que fui captando sobretudo ao longo dos últimos dois anos. Nada foi planeado, o cenário de quarentena é que levou a isto, pelo que fiquei limitado ao uso dessas imagens. Gostaria de ter enriquecido o videoclipe com mais imagens em movimento, assim como com outras imagens de actividades desenvolvidas nesta costa, pois há muito mais no mar de Cascais para ver, mas, perante a crise actual, terá de ficar para outras oportunidades.

Nestes tempos difíceis, em que todos devemos ficar em casa para evitar ainda mais a disseminação do vírus Covid-19, aqui fica um cheirinho do mar de Cascais. No videoclipe podemos ver várias perspectivas do mar, as cetárias romanas, pescadores, os apetrechos de pesca, Cascais medieval, os barcos, os acidentes marítimos, Cascais actual, a procissão a Nossa Senhora dos Navegantes, o lixo marítimo, etc.

Em breve, talvez também surja algo no mesmo contexto para a costa de Sintra. Até lá, vejam o vídeo (encurtador.com.br/eipL7), subscrevam o canal no Youtube e activem as notificações para ficarem a par das novidades.

Marco Oliveira Borges | 2020